Contradição e vaidade. Quando te acordam antes da 1a. cantoria da mesquita.

Depois da experiência do caranguejo e do buraco, o medo de intoxicação e uma viagem exaustiva, chegamos no “hotel”. E hotel está entre aspas porque na verdade não era um hotel. Era uma vila. Aqui uma vila nada mais é do que uma casa. Mas a real é que em uma casa, não tem tantos quartos. Portanto aquela gente toda, para minha surpresa, compartilhou quartos. Colchão no chão. Mais gente do que toalhas. Mais gente do que comida. – E agora entendi porque fizeram uma pausa no supermercado antes de chegar na cidadezinha. Eu, sem entender nada, fiquei no carro. Exausta. – Bom. Confesso que é tanta experiência cultural de uma vez, que na verdade eu fiquei é “P” da vida. Nem sempre é fácil estar de coração aberto o tempo todo para a nova cultura. E fiquei “P”, porque eu trouxe uma camisola curta e de alcinha (afinal temos 32 graus). E porque sem estar preparada, ia dormir no meio das muçulmanas, que não mostram os ombros, o pescoço, as pernas. Fiquei chateada e não foi por dividir quarto. Foi por falta de aviso, e por correr o risco de chamar atenção demais no novo meio no qual estava inserida: onde a diversidade sou eu. E além disso, eu estava com fome. Cansada. Em uma cidade que fica a mais de uma hora de Surabaya, que eu nem sabia o nome porque não conseguia entender o que as pessoas diziam, e o grupo do WhatsApp só se comunica em Bahasa. Com todo esse misto de sentimentos dentro do peito, só consegui pregar os olhos 1:30 da manhã. Foi quando 2:30 depois, pouco antes do cântico das mesquitas começarem (para chamar para a reza), elas entram no quarto onde eu estava, no maior alvoroço (no final das contas estávamos em duas, minha colega de quarto bem novinha, com muita gripe e sonolenta por conta do remédio. Apaguei a luz, e ela capotou antes mesmo de eu aparecer na camisola). Era hora de acordar para fazer cabelo e maquiagem. Cabelo e maquiagem? Hein? Oi? Achei que estava sonhando. Dormi de novo. E em 15 minutos não teve jeito. Era o próprio do harém de Bollywood. Luz acesa e aquela mulherada toda de um lado para o outro se preparando para o evento, que começava ao meio-dia (neste momento pensei bem…, vai ser maquiagem de casamento, para acordarmos tão cedo). Tomei um banho (tentei, porque o chuveiro apontava para o teto e a água (que tem um cheiro estranho) corria pelo chão do banheiro todo), e entre uma e outra produção, as meninas comiam noodles e salgadinhos fritos. E ainda não eram 5 horas da manhã. Minha vez. A paleta de maquiagem era tão velha e os pincéis não eram propriamente novos, que meu único pensamento era “medo” (já me basta infecção uma vez, depois de usar pincel de maquiagem em evento com multidões). Quem já trabalhou com cosmético sabe da importância que tem, a limpeza e desinfecção dos materiais com shampoo e álcool. E mergulhei com fé. De olhos bem fechados, meio dormindo, meio querendo que não fosse verdade. De vez em quando a mocinha puxava a minha pálpebra e eu não entendia o motivo. Ela queria que eu abrisse os olhos para passar delineador. Pronto. Vez do cabelo e fiquei a própria javanesa. Todas lindas de morrer. Parecia mesmo um filme. Esperamos pelo cafe da manhã (graças a deus, eu estava desesperada de fome), elas pediram delivery de nasi goren (arroz frito). Nestas alturas, e depois daquele caranguejo, comeria qualquer coisa. Por alguma razão o delivery não chegou (eu nunca entendo o que estão falando), então fomos para o hotel (ah, afinal havia um hotel), e acabamos tomando café por la. Minhas preces foram ouvidas: omelete, pão, queijo e café preto. Abençoado café ocidental. E era 7 da manhã quando seguimos para o evento, onde ficamos sentadas aguardando começar, até meio dia. (Elas. Eu fui mais é tirar fotografias…). Ainda sem acreditar, que acordamos as 4 da manhã para ficar horas esperando a coisa toda começar, derretendo naquela vestimenta (linda, mas uma sauna). A experiência foi intensa e me ajudou a entender como a coisa toda funciona. Tive novo momento difícil com a culinária local (arroz, frango frito, tofu frito, grão de bico frito – sem os vegetais apimentados que dariam o sabor em tudo, porque boiavam na água, e o WC era mesmo ali ao lado, e de novo, depois de ver o WC, e as panelas sem tampa, não dá…! Esse lance da água é uma loucura). Estou tendo a sorte de viver coisas que de outra forma nunca veria. Mas às vezes é bastante “dolorido”. Antecipei todas as tarefas que teria que fazer em dois dias e  o vôo para a mesma noite. HORAS no trânsito até o aeroporto a ponto de quase não dar. Tracei um Burguer King antes de embarcar (alívio). De volta para Jakarta. Boa noite.

3 comentários sobre “Contradição e vaidade. Quando te acordam antes da 1a. cantoria da mesquita.

  1. Letícia, fico aguardando, ansiosamente, pelas suas vivências nessa terras tão diferentes da nossa. Mas também sentindo uma enorme “peninha” de você! Força na peruca, querida, nesses primeiros meses, depois as coisas vão se ajeitando! Mil beijinhos e que o anjinho da guarda a proteja! Doliria

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  2. Leti, estava muito linda de javanesa!!! Fé em Deus e pé na tábua! Emocionalmente é desgastante estar o tempo todo aberta para outra cultura, ainda mais uma tão diferente racionalmente de conceitos de saneamento básico. Mas um país todo vive assim, também pode se adaptar. É entrar no clima, não pensar muito e seguir o fluxo! Força! Saudades, lindona! Bjs

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